terça-feira, 16 de agosto de 2011

"El principio del placer", de José Emilio Pacheco


Ao ler a postagem da Cíntia sobre Literatura Mexicana, não pude deixar de comentar com entusiasmo, defendendo o conhecimento, por parte dos brasileiros, da produção literária dos mexicanos. E, na esteira dessa necessidade de conhecimento, apresento a obra "El principio del placer", de José Emilio Pacheco, que conheci durante o intercâmbio na Argentina.
José Emilio Pacheco é principalmente poeta, embora também tenha escrito prosa. Uma das suas produções em "linha corrida" é justamente a coletânea de contos que ora comento. O que primeiro chama a atenção é a necessidade que o autor nos impõe de pactuar com o texto. Isto porque, para ele, o narrar não é simples, nem pode ser definido como sendo somente uma exposição de acontecimentos reais (ou imaginários).
Parece-me que, em sua opinião, a narrativa só pode ser completada em seu sentido com a cumplicidade do leitor, quem vai conectar as pontas soltas das muitas vozes que se enovelam para compor o relato. O texto, em Pacheco, reassume sua conotação original de tecido, de trama de vozes. Cabe ao leitor atribuir sentido a essas vozes que se cruzan, que se mesclam... 

O conto La fiesta brava é um bom exemplo de como se articulam as vozes na narrativa do autor. Temos, a princípio, a reprodução de um classificado que pergunta pelo paradeiro de um escritor. Este, por sua vez, escreve um conto también titulado “La fiesta brava” que aparece a continuação. Em seguida, temos outra narração, em terceira pessoa, que contextualiza o leitor e aclara que o autor do conto que foi lido até aquele ponto da narrativa é o mesmo homem que se procura pelos classificados. Diante disso, o que faz o leitor? Antes de mais nada, é preciso compreender que estamos frente a um relato que começa pelo final e, por esse motivo, só pode começar a ser compreendido a partir de uma segunda leitura.
Outro exemplo é o conto El principio del placer, que intitula a coletânea. Por mais que pareça comum que um adolescente escreva um diário e nele cole suas cartas de amor, não é possível ler o relato em questão com uma perspectiva ingênua. O ato de colar as cartas no diário origina um texto de múltiplas vozes, que traz  informações importantes em suas entrelinhas.

As cartas de Ana Luisa, cheias de erros de ortografia, contrastam vivamente com as de seu namorado e autor do diário. O que a principio poderia ser um detalhe, nos revela por quais motivos a família de Jorge se opõe ao seu namoro. O mesmo acontece quando o rapaz faz o diário de borrador das cartas que quer escrever a Ana Luisa. Suas tentativas frustradas confirmam, em certa medida, as dificuldades de dominar a palavra.
Por fim, destaco a presença (ou ausência) da voz do autor. José Emilio Pacheco também está presente nos silêncios e interstícios do diário de Jorge. É aí também que deve estar o olhar do leitor para capacitá-lo a perceber que, através da perplexidade juvenil com que Jorge observa a corrupção e a mentira, o autor nos alerta para alguns de nossos dramas latino americanos.

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